sexta-feira, 27 de julho de 2012

Estigmatizado à nascença

Opinião:
26 de Julho - 2012

Conforme assumido pelo Governo, com a aprovação do Plano de Redução e
Melhoria da Administração Central (PREMAC) em setembro de 2011, a
fusão da Autoridade Florestal Nacional (AFN) e do Instituto de
Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB), enquadra-se no
processo de melhoria organizacional da Administração Central e no
ajustamento do peso do Estado aos limites financeiros do País.


Em maio de 2012 é aprovada, em Conselho de Ministros, a criação do
Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, I.P. (ICNF). A
aprovação da orgânica do ICNF ocorreu passados quase 11 meses da
tomada de posse do Governo, 8 meses após a publicação do PREMAC e 5
meses após a aprovação da orgânica do Ministério da Agricultura, do
Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (MAMAOT), que o
tutela.

O ICNF herda o estatuto das duas autoridades nacionais com atribuições
nos espaços silvestres em Portugal. A AFN assume o património
histórico da Administração Florestal das Matas do Reino, criada como
organismo autónomo em 1824, e o ICNB descende do Serviço Nacional de
Parques, Reservas e Património Paisagístico, criado em 1975,
incorporando a Divisão de Parques e Reservas, da então Direção Geral
do Fomento Florestal.

No histórico de entidades antecessoras da AFN, com as mais
variadíssimas designações nas últimas décadas, assistiu-se a alguns
momentos de controvérsia no que respeita á florestação com espécies de
rápido crescimento (ERC). Uma delas, que na altura estigmatizou, e
talvez ainda estigmatize os Serviços Florestais do Estado, foi a
transferência de muitos técnicos superiores destes para as empresas da
indústria de celulose, em fase de grande expansão nas décadas de 70 e
80. No final dos anos 80, os serviços conseguiram contribuir para o
apaziguamento social dos ânimos face á contestação às florestações com
as ERC. A sua imagem ficou contudo beliscada, talvez mais por motivos
intrínsecos, do que por fatores externos. Facto é que o seu papel se
tem vindo a desvalorizar socialmente ao longo dos anos.

O ICNB e seus antecessores, por seu lado, tiveram uma maior aceitação
social, sobretudo em meio urbano, vinculado que está à conservação da
Natureza. Foi igualmente contestada a sua atuação, designadamente no
que respeita á gestão da Rede Nacional de Áreas Protegidas, embora
aqui num contexto de condicionamento da atividade económica.

Concretizada a fusão, não deixa de ser confrangedor assistir à
repetição da história, não pelos melhores motivos.

Ao invés de ver valorizados os aspectos socialmente positivos do
património histórico dos dois organismos que o antecedem, assiste-se
agora à estigmatização da nova entidade, associando-a a uma proposta
de alteração legislativa avulsa, extemporânea e mesmo irresponsável,
concretamente a que pretende alterar as regras nas ações de
florestação com as ERC.

Quer se queira quer não, por profunda inabilidade política, o ICNF
está daqui para a frente associado à promoção inconsequente da
florestação com eucalipto, promoção essa desprovida de preocupações
quanto a uma estratégia nacional, ao ordenamento do território, ao
planeamento florestal e, sobretudo, sem exigir garantia de uma gestão
sustentável dos espaços agrícolas e silvestres que venham a ser alvo
de florestação com estas espécies.

A indústria de celulose e papel é importante para Portugal,
compreende-se até o esforço empresarial na defesa do negócio, não se
entende é a postura do MAMAOT, quer ao procrastinar a definição de uma
Visão para os espaços silvestres em Portugal, quer ao permitir
estigmatizar o ICNF logo à nascença, ao fazê-lo debutar perante o País
com uma intervenção totalmente desastrosa.

Paulo Pimenta de Castro

Engenheiro Florestal

Presidente da Direção da Acréscimo – Associação de Promoção ao
Investimento Florestal

http://www.vidarural.pt/news.aspx?menuid=8&eid=6584&bl=1

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