domingo, 27 de setembro de 2015

Gado à solta no concelho do Crato assusta a população e lança o pânico nos automobilistas

CARLOS DIAS 26/09/2015 - 09:46
Cerca de 300 bovinos procriam em estado selvagem sem qualquer controlo sanitário à tuberculose e à brucelose, destroem hortas, pomares, pontes e provocam acidentes de trânsito nas estradas da região. As autoridades administrativas tardam a intervir.

 
Em Segura, há uns anos, também houve casos de ataques de vacas e touros a pessoas e bens ADRIANO MIRANDA

Os automobilistas que circulem no concelho norte alentejano do Crato têm de o fazer com atenção redobrada pois há alguma probabilidade de lhe aparecer no caminho um touro tresmalhado ou uma manada de vacas, sem que o dono esteja identificado. O caso mais recente, aconteceu na passada semana. Um bezerro atravessou-se na frente de uma viatura que ficou com danos apreciáveis mas sem ferimentos para o condutor. O animal foi abatido.

O testemunho prestado ao PÚBLICO por Dionísio Semedo Lopes, uma das pessoas lesadas, é elucidativo: "Há conflitos do dono dos animais — que no entanto diz que estes não são dele — com quase toda a gente, há acidentes nas estradas, árvores partidas, hortas destruídas". O agricultor ainda tem mais para contar: "Os animais partem as cercas de outras explorações" e até uma plantação recente de azinheiras e sobreiros "foi arrasada e nem uma ponte antiga escapou" às marradas e aos cascos das vacas e touros.  

Semedo Lopes assegura que a exploração de onde escapa o gado é propriedade de Luís Miguel Pestana. Terá entre 400 a 500 hectares de área e está localizada na freguesia de Monte da Pedra, no concelho do Crato. Recorda que os conflitos "duram há pelo menos uma dúzia de anos" e que neste momento andará à solta pelo concelho um efectivo com cerca de 300 bovinos que "continuam a procriar sem qualquer controlo sanitário", assegura.

Há dezenas de lesados que estão revoltados pela impunidade com que actua o proprietário da herdade. António Marmelo também é agricultor mas até agora escapou à invasão do gado. Porém, descreve a situação de uma amiga que "viu a sua horta ser toda espezinhada e comida". Diz que as pessoas não encontram resposta às suas queixas por parte das autoridades que, adverte, "só irão actuar quando houver uma tragédia".

Maria do Rosário Matutino, autoridade sanitária veterinária concelhia, diz ao PÚBLICO que a situação é resultado dos "constrangimentos burocráticos em Portugal". A intervenção das autoridades, tanto locais como regionais, arrasta-se há vários anos sem uma decisão que trave os constantes atropelos à lei praticados pelo proprietário da exploração, Luís Miguel Pestana, apesar das ameaças que persistem para a saúde pública e o bem-estar dos animais.

O primeiro contacto que teve com o problema foi em 2012. Naquele ano, foi contactada por um agricultor que lhe mostrou fotografias de bovinos mortos no interior da exploração de Miguel Pestana. Acompanhada de militares da GNR do Crato deslocou-se à herdade e contou 11 cadáveres de bovinos espalhados pelo terreno, e "uma fonte potencial de riscos para a saúde pública, animal e para o ambiente". Os animais vivos que observou, estavam "muito magros" e doze entre os 3 e 12 meses não tinham identificação.

No relatório que então enviou ao gabinete jurídico da Direcção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) solicitava a punição do proprietário da exploração por "demonstrar não ter o mínimo de respeito pelo animal enquanto ser vivo, nem pelo meio ambiente que o rodeia".  

Por incumprimento das obrigações sanitárias, nomeadamente a falta de rastreio da tuberculose animal e da brucelose e o facto de nem sequer saber o efectivo pecuário que possuía, a DGAV decretou o "sequestro sanitário por constituir um grande risco quer para a saúde animal quer para a saúde pública".

Na sequência desta decisão, Miguel Pestana foi notificado que os animais iam ser retirados da exploração e que ele seria inibido do exercício da actividade pecuária por um ano. O visado recorreu e o processo entrou em compasso de espera.

Enquanto a decisão das autoridades não chega "há dezenas de lesados que estão revoltados pela impunidade com que actua o proprietário da herdade", protesta Marco Mendonça, presidente da Junta de Freguesia de Monte da Pedra.

E, no meio tempo, quem circula na estrada que liga as freguesias de Gáfete e Monte da Pedra continuará sujeito a acidentes por estar "sistematicamente invadida pelos animais", alerta o autarca e o tenente-coronel Carlos Belchior do Comando Territorial da GNR de Portalegre. O militar confirma a presença de bovinos na via pública no concelho do Crato que "tem provocado alguns acidentes".  

Resta à GNR actuar através da aplicação de autos de contra-ordenação e a elaboração de informação que "entrega às autoridades administrativas locais e regionais que têm conhecimento da situação", esclarece.

O PÚBLICO contactou o proprietário da exploração mas este recusou-se a prestar esclarecimentos.

Sem comentários:

Enviar um comentário