Com a derrocada na venda de créditos de carbono aos países ricos,
nações emergentes como o Brasil perdem algo valioso: um incentivo
financeiro para poluir menos
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José Alberto Gonçalves Pereira, da EXAME
Christopher Furlong/Getty Images
Termelétrica na Inglaterra: a crise na Europa tirou o ímpeto da
indústria e derrubou as emissões de CO2
São Paulo - Ganhar muito dinheiro com ar. É possível? Entre os anos de
2006 e 2008, muitas empresas do Brasil e de outros países emergentes
estavam convictas de que sim.
E tinham razões para isso. Elas estavam faturando alguns milhões de
dólares com a venda de créditos de carbono do Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo (MDL), da ONU, uma das peças-chave do Protocolo
de Kyoto — tratado assinado em 1997 que determinou pela primeira vez
limites para as emissões de gases causadores do efeito estufa nos
países ricos.
Funcionava assim: uma companhia brasileira apresentava à ONU um
projeto de MDL provando que havia reduzido as emissões de CO2 ao
trocar, por exemplo, a matriz energética suja de uma fábrica por uma
de fonte renovável. Com isso, ganhava créditos, que vendia a uma
empresa europeia ou japonesa que precisava cumprir metas de baixar
suas emissões de gases estufa.
Esse comércio entre emergentes e ricos teve seu auge em 2007, quando
movimentou 7,4 bilhões de dólares. De lá para cá, porém, o MDL perdeu
fôlego, e o que se vê hoje é o ocaso de um dos símbolos da luta contra
o aquecimento global.
Segundo um relatório do Banco Mundial divulgado no início de junho, a
venda desses créditos gerou apenas 1,5 bilhão de dólares em 2010. Isso
representou 1% do total de 142 bilhões de dólares do mercado global de
carbono em 2010, que abrange outros tipos de negociação. Entre 2005 e
2007, essa fatia chegou a ser de quase 20%.
O mercado de carbono começou a dar sinais de fadiga em 2008, quando a
crise financeira mundial derrubou os preços dos créditos. A crise
tirou também o fôlego da indústria europeia, que, ao produzir menos,
passou a precisar de menos ajuda dos emergentes para cumprir suas
metas de redução de gases estufa.
Até dezembro de 2009, porém, acreditava-se que os governantes dos
países do mundo reunidos na conferência do clima da ONU, em
Copenhague, na Dinamarca, definiriam um acordo global de redução de
emissões para depois de 2012, data em que o Protocolo de Kyoto expira.
Mas isso não aconteceu.
Foi-se a expectativa e com ela os negócios com créditos de carbono do
MDL. "Ninguém sabe o que vai ser do MDL a partir de 2013", afirma
Flavio Pinheiro, diretor da Econergy, consultoria de projetos de
carbono da empresa de energia francesa GDF Suez. "Não fosse essa
insegurança, desenvolveríamos mais 50 projetos, além dos 71 de nossa
carteira atual."
Sem nenhuma garantia de que os créditos de projetos registrados a
partir de 2013 terão compradores, o que as empresas estão fazendo é
correr para aprovar seus projetos de MDL na ONU até o final de 2012.
Uma das companhias que estão brigando contra o relógio é a
ArcelorMittal.
O diretor de meio ambiente global da siderúrgica, o belga Karl
Buttiens, esteve no Brasil em maio e deu ordens para a subsidiária
apressar os quatro projetos em desenvolvimento. No cronograma inicial,
a ArcelorMittal levaria, no mínimo, mais três anos para obter o
registro.
Dois desses projetos estão relacionados ao uso de carvão vegetal, em
vez de carvão mineral, na produção de ferro-gusa na usina de Juiz de
Fora, em Minas Gerais.
A siderúrgica já tem o registro de um projeto de MDL, que recupera
gases como o monóxido de carbono produzido na aciaria de Tubarão, no
Espírito Santo, para gerar energia em suas termelétricas.
A venda de parte desses créditos ao banco alemão KfW em 2009 rendeu à
ArcelorMittal 5 milhões de dólares. Hoje, a empresa negocia com o
banco a venda de um segundo lote de créditos do mesmo projeto.
"O MDL tem sido um estímulo para que os países emergentes invistam em
tecnologias limpas", diz José Otávio Franco, gerente de meio ambiente
da ArcelorMittal Aços Longos. Dito isso, a questão que se impõe é
quanto seu enfraquecimento vai atrapalhar essa trajetória.
"Vamos continuar apostando em processos produtivos mais sustentáveis,
mesmo que não possamos contar com o empurrão da venda de créditos do
MDL", diz Franco. É uma visão otimista, que casa com a de
especialistas que acreditam na recuperação desse mercado.
Para Carlos Delpupo, da consultoria Instituto Totum, o acidente na
usina japonesa de Fukushima e o renascimento da aversão à energia
nuclear podem levar a um uso maior de combustíveis fósseis na Europa.
"Esse aumento do uso de energia suja terá de ser compensado em parte
com créditos do MDL", diz Delpupo. É uma hipótese. O que já virou uma
certeza para as empresas de países emergentes é que ganhar dinheiro
com ar — ou melhor, com créditos de carbono — já foi bem mais fácil.
http://exame.abril.com.br/revista-exame/edicoes/0995/noticias/o-fim-do-mercado-de-carbono?page=2&slug_name=o-fim-do-mercado-de-carbono
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