terça-feira, 28 de junho de 2011

Míldio ao ataque das vinhas portuguesas

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António Falcão
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Segunda-Feira, 20 de Junho de 2011 às 10:51Este tem sido um ano
extremamente difícil para a viticultura. Temperaturas altas alternando
com chuvas são as condições ideais para os fungos, organismos que
tanto podem ter de benéfico como de destruidor. Neste caso, o fungo
culpado chama-se Míldio e já provocou avultados prejuízos.

Infelizmente não há dados muito concretos mas, pelo que ouvimos falar
com vários intervenientes, um pouco por todo o país, o Míldio atacou
em força este ano. A culpa foi das peculiares condições
meteorológicas, que alternaram em Abril e Maio entre a chuva e o
calor, um ambiente paradisíaco para o Míldio, que, como todos os
fungos, é fã do calor e humidade.
Pelo que auscultámos, todas as regiões foram afectadas mas as menos
habituadas a lidar com estes problemas, como as do interior e sul,
foram as que mais sofreram. Mário Figueiredo, presidente da
Cooperativa Agrícola de Pegões, dizia-nos que alguns agricultores que
conhecia tinham a vindima feita: "chegaram atrasados; quando acordaram
o mal estava feito". Luís Santos, técnico da AVIP, dizia que, ao
contrário do que é normal, a doença começou pelos cachos e estendeu-se
às folhas. Uma versão mais grave e mais tardia acabava por pintar de
negro os cachos de um dia para o outro, terminando de uma vez por
todas com qualquer aspiração de colheita.
A situação foi de tal maneira generalizada que chegou a haver ruptura
nos stocks de fungicidas em algumas empresas de produtos químicos. Uma
história contava que um viticultor alentejano teve que recorrer a
embalagens de 250 gramas, as únicas existentes, para tratar a vinha de
emergência. Consta que teve um homem o dia todo a abrir pacotes…
Um ano complicadíssimo
Os técnicos das empresas de agroquímicos são espectadores
privilegiados desta situação. João Farraia Pessoa, gestor do sector de
fungicidas na Sapec Agro, disse-nos que "as regiões mais afectadas
foram o Douro, onde o Baixo Corgo terá tido uma quebra de produção
estimada de 50%. Ribatejo e Península de Setúbal virão logo a seguir,
com 40%, e depois o Alentejo, com 30%, especialmente nas zonas da
Vidigueira e Redondo. Situação semelhante ocorreu nas Beiras,
essencialmente na Beira Litoral, Bairrada e na região de Viseu. Quanto
ao Minho, e ainda segundo este técnico, terá havido uma quebra mais
pequena, de apenas 20%. João Farraia Pessoa acredita que é
"provavelmente a região mais bem preparada para este tipo de fortes
ataques já que é a que tradicionalmente é mais atacada por esta
doença".
A experiência e o saber de viticultura foram mais uma vez cruciais:
várias grandes empresas que sondámos reconheceram a gravidade dos
ataques mas nenhuma delas teve prejuízos sérios. João Corrêa,
enólogo-chefe da Companhia das Quintas, com vinhas em várias zonas do
país confirmou-nos isto. E Filipa Tomás da Costa, da Bacalhôa Vinhos,
também. Idem para Domingos Soares Franco, da José Maria da Fonseca.
Outra confirmação veio de António Luís Cerdeira, produtor e técnico da
CVR dos Vinhos Verdes. As equipas de campo actuaram a tempo e
controlaram a doença. Assim escrito parece fácil mas não é: mesmo com
os meios adequados há muitas decisões a tomar: quais os produtos
certos, modos correctos de aplicação, timings exactos, muita atenção à
meteorologia, correcto amanho da vinha, etc. O conhecimento e a
experiência são aqui fundamentais. Quem esteve desatento, ou não tinha
tempo, conhecimento ou meios, acabou por pagar uma pesada factura:
enormes quebras de produção, que podem mesmo chegar à perda total.
Foi o que aconteceu a um agricultor do Dão: detectou o Míldio ainda a
tempo mas não havia qualquer pulverizador disponível. E isso não
espanta: um pulverizador é caro para um pequeno viticultor e muitos
recorrem a empresas especializadas ou a amigos. Ora, trabalho de
pulverização é coisa que não tem faltado nestes últimos tempos. Em vez
dos habituais 3 ou 4 tratamentos, todos os intervenientes com quem
falámos – de várias regiões do país - tinham já efectuado o dobro (ou
quase) das acções preventivas ou curativas na vinha. Às vezes à
pressa. Se nos Vinhos Verdes ou Bairrada se faziam 4 ou 5 acções, este
ano fizeram 8 ou 9; e no Alentejo, das 2 ou 3 passou-se para 4 ou 5.
"A actual campanha ficará, seguramente, na memória dos viticultores
como uma das mais difíceis do passado recente, no controlo do míldio
da videira", garante João Vila Maior, da Bayer CropScience. E
acrescenta outro factor: "o período da Páscoa e o 25 de Abril levou a
que grande parte das vinhas não fosse tratada numa perspectiva
preventiva. Foi o início do descalabro…". O factor técnico também teve
influência: "num ano em que mesmo quem tratou bem esteve sujeito a
dificuldades, quem cometeu erros teve prejuízos sérios". E houve gente
que utilizou os fungicidas errados, ou em doses menores às homologadas
ou ainda com pulverizações mal efectuadas…
Mesmo os que trabalharam bem têm que contabilizar os custos. O enólogo
e produtor Nuno Cancela de Abreu, com explorações no Dão, disse-nos,
em tom de brincadeira séria, que desta maneira avisava há dias o seu
encarregado: "não me diga quanto é que eu já gastei em produtos
químicos; não quero saber…". Mas a estratégia é mesmo não desanimar,
porque tristezas não pagam dívidas.
http://www.revistadevinhos.iol.pt/noticias/mildio_ao_ataque_das_vinhas_portuguesas_8774

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