segunda-feira, 19 de novembro de 2012

As herdeiras do vinho

por Fernando Melo Fotografia de Reinaldo Rodrigues/Global Imagens

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Elas transportam um legado espiritual e material no seu quotidiano.
Algumas vezes por via direta, outras por escolha própria, estas dez
mulheres que mostramos são herdeiras de grandes casas vinícolas. E
estão prontas para a sucessão. O mundo do vinho é tradicionalmente
masculino, e poucas vezes, salvo exceções como a de Dona Antónia
Adelaide Ferreira, viu uma mulher aos comandos de uma casa. Estas
mulheres já fazem parte de uma nova era e trazem consigo a grande
novidade da abertura para o mundo, que há duas gerações era quimérica
em Portugal. Sendo assim, representam uma revolução de formato dois em
um. O mundo do vinho é hoje totalmente global e pede uma leitura
radicalmente diferente da de outrora. Aí estão elas, aquelas com que
podemos e devemos contar para construir a próxima geração vinhateira.
As nossas princesas do vinho.

Uma herança sem antecedentes
Catarina Vieira
Herdade do Rocim, enóloga

Filha de professora primária do Colégio Moderno, pai engenheiro e
militar de carreira, Catarina nasceu em Lisboa, mudando-se depois para
Leiria, terra materna e paterna. Era criança de tenra idade quando
aconteceu a mudança e foi o acontecimento feliz de a família se ter
instalado temporariamente em casa dos avós paternos enquanto aguardava
o termo da construção da casa que a fez ter o primeiro contacto com o
mundo do vinho. «Lembro-me muito de ir às vinhas com o meu avô Manuel
e de brincar na adega», recorda com carinho a jovem enóloga. Em
pequenina, queria ser ginasta ou bailarina, mas cedo se lhe pegou a
paixão pela terra, num apelo irredutível. Foi isso que ditou a entrada
no Instituto Superior de Agronomia, em Lisboa, acrescido ao fascínio
pelo seu pai, que lhe indicava só por si que a engenharia seria bom
caminho.
O grupo Movicortes, fundado e presidido pelo seu pai, José Ribeiro
Vieira, cedo viria a albergar a nova vocação da vinha e do vinho. «O
meu pai nasceu para ser gestor e líder e eu também quero deixar a
minha marca», que só já dento do ISA, em pleno curso, sentiu o
«clique» da viticultura. «Devo muito ao Prof. Rogério Castro e ao seu
assistente Eng. Amândio Cruz.» Foi para Bolonha fazer o trabalho final
de curso e logo que regressou inscreveu-se na pós-graduação da Escola
Superior de Biotecnologia da Universidade Católica do Porto. Esta fez
às escondidas do pai. «Ele achava que as filhas estudavam de mais»,
diz, sorrindo. Já estava comprada a Herdade do Rocim, onde se instalou
uma adega moderna seguindo design vanguardista, com custos
rigorosamente controlados.
«Estamos todos a trabalhar para o futuro, nada do que temos é para
nós; queremos deixar legado.» Ensinamento herdado de seu pai. Os
resultados depressa apareceram, crescendo de forma sustentada e
colocando o Rocim como marca de um Alentejo especial, «com vinhos mais
elegantes que potentes». A relação que tem com Pedro Ribeiro, enólogo
da Herdade dos Grous, agradou ao seu pai que, apesar de prematuramente
desaparecido, se eternizou no amor pelas suas filhas. «Fazer sempre o
melhor que posso», é o seu lema e imperativo.

Vinha de mulheres
Francisca Van Zeller
Bacalhôa Vinhos, relações Públicas

A Quinta do Vale Dona Maria, no Douro, passou de mãe para filha ao
longo de três gerações e é daí que Francisca vem. É aí que tem as suas
raízes. Solteira ainda, quando casar tem de ser com alguém que
respeite e goste do vinho. «A ligação ao vinho é muito importante para
mim.»
A primeira vocação de Francisca surgiu aos 5 anos e era treinadora de
golfinhos. Depois, veterinária, e depois ainda arquitetura. Foi no
meio deste serpentear de possíveis profissões que aos 10 anos a filha
de Cristiano e Joana Van Zeller chegou a uma decisão fundadora para o
resto da sua vida. «Decidi que ia ser cozinheira de vinhos.»
Acompanhou o pai e um enólogo numa prova e como cheiravam, provavam e
falavam sobre os vinhos, a infanta convenceu-se que o estavam a
cozinhar. Antes de chegar ao vinho, contudo, ainda foi estudar
História para Inglaterra, onde fez a licenciatura, com uma curiosa
especialização em história da mulher não-ocidental. Chamava «linda
terra» a Inglaterra, em pequenina.
Foi educada na Oporto Business School, anglófona, e depois seguiu para
o Royal Holloway College, para estudar História. Ainda queria seguir
Política, assunto por que tem paixão. Escreve muito desde a
adolescência, sempre para si. «Não sei se conseguiria escrever um
grande romance.» Também não tentou. Aos 7 anos, sofreu a que considera
ter sido a primeira perda da sua vida. «Foi quando a Quinta do Noval
foi vendida.» É uma das mais emblemáticas propriedades do Douro e
deixou-lhe as mais ternas memórias, nos tempos de vindima. Não tinha
então consciência clara de que a sua família era vinhateira, «aliás
foi bastante tarde que me apercebi disso».
Regressada de «linda terra», viveu e trabalhou em Lisboa, cidade de
que é grande fã. Ao ingressar na Bacalhôa, para trabalhar nas relações
públicas da casa, não se sentiu traidora do seu Douro nem da sua
família. «Isso é incondicional.» Mas é peremptória: «Esta é neste
momento a minha vida profissional e estou muito bem nela.» Num
aniversário, o pai telefonou-lhe e disse-lhe que tinha registado uma
marca de vinho e que esse seria um dia o vinho dela, para ela fazer.
«Comovi-me muito, foi uma grande e bonita surpresa.» Veremos o que o
destino reserva.

Vinho na terra do café
Rita Nabeiro
Monte Mayor, designer

Rita Nabeiro é uma pessoa invulgar porque consegue imprimir um cunho
cultural a todas as vertentes do seu trabalho. É verdade que vinho é
cultura, mas não é menos verdade que não é propriamente o que
transpira do afã de vender, exportar e promover. Tem surpreendido pelo
brilho das suas wine talks, sessões de debate que até agora se
debruçaram sobre o vinho na música e nas artes plásticas. A arte
urbana exerce grande fascínio na designer. Outras sessões se seguirão.
As linhas criativas que tem vindo a desenvolver juntamente com o
publicitário Carlos Coelho são inovadoras, tanto em termos estritos de
criação de marca como também em arrojo, bastante raro no universo
vínico. A utilização de novos materiais está também na lista de
prioridades e tem vindo a ser seguida de forma consistente. Numa casa
que é de cafés vive-se hoje intensamente o vinho.
A seguir ao seu curso de Design de Comunicação na Faculdade de
Belas-Artes de Lisboa, trabalhou quatro meses em Parma, como designer
numa agência de publicidade. Veio para cá e continuou a trabalhar em
design e de certa forma fez carreira. Começava entretanto o projeto da
Adega Mayor, que seria o braço Delta para os vinhos, iniciativa do pai
e do avô. A adega foi implantada nos terrenos onde outrora andava de
bicicleta, pelo que a ideia de apresentar uma proposta de imagem da
empresa apelou muito a Rita Nabeiro. Saiu vencedora, sem
favorecimentos familiares. «O meu avô não é de dar privilégios
especiais à família», comenta. Com Paulo Laureano, enólogo consultor
da Adega Mayor, aprendeu os fundamentos do vinho, «sempre tive muita
atração por explorar universos aromáticos e o vinho é todo um mundo
novo nesse aspeto».
Hoje Rita é gestora de mão cheia e tem todo o tempo ocupado com as
diferentes frentes da empresa. Em Campo Maior, trata dos assuntos
financeiros, enoturismo e vinho, enquanto em Lisboa funciona a
coordenação comercial e de marketing. «É engraçado, porque tudo
aconteceu de uma forma natural, nunca me disseram para fazer isto ou
aquilo.» Crescimento orgânico, ou demonstração da máxima «quem sai aos
seus...»

O destino marcado
Mafalda Guedes

Sogrape, Herdade do Peso e vinhos do Novo Mundo, gestora
«Para mim, o mais importante é o privilégio de trabalhar todos os dias
com o meu pai e o meu avô.» A Sogrape sempre fez parte da família, mas
Mafalda Guedes nunca se tinha apercebido do que era afinal estar
dentro da empresa. «Tudo tem significado e tudo é feito com carinho.»
Está há dois anos na Sogrape, depois de estudar gestão em Oxford,
passar por uma consultora internacional e ainda trabalhar num banco em
Angola. «Estudar em Inglaterra foi muito importante para aprender mas
também a dar valor ao que tinha cá.»
Na sua infância, fez uma redação em que dizia que quando fosse grande
queria ser economista e sentar-se na cadeira do seu avô. «Não me
lembro de alguma vez ter tido vontade de não trabalhar na Sogrape; foi
sempre qualquer coisa que desejei muito.» Em criança, gostava muito de
ir com o pai para a empresa nas férias. «Deixava-lhe papéis colados na
porta do quarto a pedir para me levar com ele no dia seguinte.» É
otimista em relação aos vinhos portugueses e seu sucesso no mundo,
dentro e fora do universo Sogrape. Vinhos maus? «Acho que há vinhos
menos bons, gosto mais de ver assim.»
Trabalha no marketing, em equipa, e gosta. «Sinto que estou a aprender
muito, com pessoas muito experientes.» A Herdade do Peso (Alentejo) «é
uma marca estratégica para a empresa, sinto o peso da responsabilidade
e que se espera muito de mim, não posso senão querer corresponder".
Fala muito com o avô, Fernando Guedes. «Gosto muito de ir com ele às
vinhas.» Está a fazer uma pós-graduação em enologia na Universidade
Católica do Porto, o que lhe está a dar «uma perceção diferente do
vinho, tanto em termos teóricos como práticos». Fez a vindima na
Quinta da Leda, onde manuseou os equipamentos in loco e participou em
todas as manobras. Chile e Argentina também tiveram impacte na jovem
gestora. «Sinto muito orgulho no que nós, portugueses, ali fizemos, e
somos admirados lá por isso.» Só falta conhecer a Nova Zelândia.

Herança com terroir
Maria de Castro
Quinta da Pellada, enóloga

Maria de Castro estudou biotecnologia na Universidade Lusófona e
depois fez pós-graduação em Bordéus. «Enquanto estudante, até tinha
alguma inclinação para a investigação, atraía-me.» Mas Maria sai ao
pai, Álvaro de Castro: não é de estar entre quatro paredes. «De
repente, projetei-me sempre enfiada num laboratório e não gostei.» Ao
mesmo tempo, ir diretamente para as vinhas da família e trabalhar com
o seu pai tinha de ser só depois de ganhar alguma experiência. «Fui
para a DFJ, e foi uma experiência enriquecedora, que hoje considero
fundamental para o meu início de carreira.»
Assumir o seu lugar no projeto da Pellada acabou por ser a sua opção
de vida. «Achei que não fazia sentido ir começar um projeto
individual, quando o meu perfil ideal de vinhos é o da Pellada.» Há um
certo choque de feitios, «porque eu e o meu pai somos um bocado
parecidos, procuramos as mesmas coisas». Dá o exemplo do trabalho com
a casta Terrantez que estão a desenvolver, em que ambos põem muitas
esperanças. «O Dão é berço de vinhos naturalmente elegantes, e isso é
que é importante garantir.» Tem orgulho na sua região e gosta da
popularidade crescente de que está a gozar entre os enófilos
portugueses. «No estrangeiro também estamos a conseguir muito bons
resultados.»
O repto que Maria sente em termos do trabalho que tem pela frente, é
«chegar a mais mercados exteriores, garantir que consolidamos as
nossas vendas». O marido trabalha em Lisboa e os filhos frequentam a
escola na capital. Maria privilegia a família, mas precisa
absolutamente do contacto com a terra, adega e vinhas. «Fico infeliz
se passo muito tempo sem ir à Pellada.» O trabalho do vinho é exigente
e precisa de cuidados quase quotidianos. É de opinião que temos de
recuperar a figura do vigneron, «que é a pessoa ligada à terra e
especializada nas suas vinhas, seguindo um estilo próprio de vinhos».

Do marketing para as vinhas
Rita Pinto
Quinta do Pinto, gestora

Formou-se em Gestão na Universidade Católica e entrou para a Unilever,
que hoje considera «o emprego da minha vida». Muita gente nova,
ambiente eletrizante «e sobretudo uma grande escola profissional».
Esteve um ano a fazer estudos de mercado para os diferentes clientes,
passando depois para o marketing. «Calhou-me a certa altura a parte
alimentar e fiquei sempre com um bichinho e gosto especial por essa
área.»
Foram seis anos muito intensos e proveitosos. Passou depois para a
Panrico, onde esteve dois anos. Quando o pai de Rita decidiu em 2003
comprar a quinta, em Alenquer, nunca pediu a nenhum dos três filhos
que fosse trabalhar para lá. Rita foi a primeira, seguindo-se a mais
nova, Ana, que chamou a si os mercados exteriores e o trabalho de
promoção. O irmão continua a trabalhar na banca. «O que me cativou foi
a terra e aconteceu numa vindima.»
O vinho em si mesmo não apelava muito à gestora. «O clique deu-se a
seguir à vindima de 2008.» Estava frio e de repente sentiu que estava
ali o seu trabalho futuro. «Ainda estou a aprender, mas estou a
sentir-me bem no meu papel, apesar de ser um negócio complexo.» Está a
planear a diversificação da oferta, o próximo passo será provavelmente
o azeite. «Nós não somos muito competitivos em termos de preço nos
vinhos, mas somos diferenciados, especialmente na utilização de castas
estrangeiras e mix com castas portuguesas.» A grande cliente familiar
é a avô materna, que todos os dias tem mais de uma dúzia de
descendentes a almoçar. «Só se serve o nosso vinho», diz com um
sorriso, «enquanto que em minha casa é ao contrário, sistematicamente
ficamos sem vinho nosso». Rita não tem medo dos insucessos, «o que é
preciso é saber recuperar e corrigir trajetórias rapidamente».

Memórias carinhosas
Teresa Barbosa
Ninfa, gestora

João Barbosa, pai de Teresa, foi um dos proprietários das grandes
Caves Dom Teodósio, em Rio Maior. Com a venda da empresa, João
afastou-se por alguns anos da produção de vinho na região. Decide a
certo ponto voltar ao jogo do vinho, com as marcas Ninfa (Tejo) e Lapa
dos Gaivões (Alentejo), secundado pelos seus filhos, comprando terra e
instalando vinha. No primeiro caso, foi o repto de uma cadeia de
distribuição que desencadeou a ideia de produzir vinho, no segundo foi
um anúncio no jornal de um terreno de dez hectares que foi
irrecusável. As memórias de Teresa falam por si: «Lembro-me de ainda
criança ir brincar para a Quinta de São João Batista, nos Riachos, e
sentir os cheiros na sala das barricas que me ficaram para sempre na
memória.»
Hoje os tempos são outros, mas as memórias carinhosas permanecem. Já
com a empresa iniciada, foi a família toda - Teresa tem quatro irmãos
- fazer o nível 1 da WSET (Wine & Spirits Education Trust). «O meu pai
teve 96 pontos, eu fiz o curso mais tarde que todos até com alguma
relutância, e tive 92.» Competitiva, desafiou o pai, dizendo-lhe que
no próximo nível iria ultrapassá-lo. Quando era pequenina, Teresa
queria ser astronauta, depois médica, mas acabou por enveredar pela
engenharia do ambiente em Coimbra.
Confessa não ser fácil trabalhar com o pai, mas juntos conseguem levar
as coisas para diante. Teresa trabalha o mercado nacional, enfrentando
diariamente novos compradores e consumidores. «Dá-me um enorme gozo
entrar num restaurante e ver uma garrafa nossa em cima de uma mesa.»
Foi estruturante para o que faz hoje o tempo em que trabalhou num
restaurante italiano de Coimbra, «aprendi o que era de facto atender
pessoas». Fez nessa altura um intervalo nos seus estudos, e ainda
trabalhou em duas lojas de acessórios de moda e roupa. «Depois voltei
para o curso, com outra atitude.» Hoje, já imersa no assunto do vinho,
continua a exigir diferença. «O Lapa dos Gaivões é dos poucos vinhos
alentejanos de que gosto porque é fresco e, para mim, os vinhos do
Tejo são os melhores.»

A capacidade da multiplicação
Sandra Tavares da Silva
Quinta de Chocapalha, enóloga

Desde criança que o vinho é vivido em casa de Sandra de forma
especial. Brincava, desde pequena, na propriedade da família em
Alcochete, criando laços que ficaram na sua memória e no seu coração.
O pai, Paulo Tavares da Silva, teve responsabilidades de direção na
Adega Cooperativa da Merceana, criando laços importantes com a região
de Alenquer, especialmente Aldeia Galega. Aí viria, de resto, a
comprar a Quinta de Chocapalha, uma das mais belas e peculiares
propriedades da zona, pela conjugação única de solo e clima que
apresenta. O labor de seleção de castas, plantação e orientação das
vinhas saiu de quem conhece como ninguém a Estremadura. Os espaços de
adega, estágio e enoturismo configuram uma pérola da atividade na
região, e um exemplo de como na simplicidade pode mesmo estar a
solução. É uma sala de visitas, não só da família, mas também de todo
este pedaço de território que orla a Grande Lisboa. Apesar do seu
estatuto, a jovem Sandra optou por fazer os seus estudos superiores no
Instituto Superior de Agronomia, a que juntou um mestrado em enologia
em Itália. Para trás ficava uma vida prometedora como modelo, tendo
desfilado nas principais passerelles do mundo. «Eu preciso de mexer na
terra e de estar perto dela.» Quando regressou de Itália, a única
região que não conhecia era o Douro, mas rapidamente se tornou o
destino da sua vida adulta. É ainda hoje a enóloga da Quinta do Vale
Dona Maria, bem como do projeto Pintas, que detém com o seu marido,
Jorge Serôdio Borges. Reparte o seu tempo entre Alenquer, Rio Torto e
Vale Mendiz, com igual paixão. «São projetos muito diferentes e
revejo-me em todos.» A seguir ao primeiro filho, vieram... dois! Nota
forte de maternidade, com os gémeos a aumentar a complexidade da vida
de Sandra, mas a que sabe reagir como ninguém, com um sorriso. Moram
mesmo junto ao Douro, com as vinhas ao fundo e a sua casa é um
verdadeiro centro de acolhimento de jornalistas e críticos
estrangeiros, além, claro, dos amigos que são muitos.

Celebração no feminino
Maria Manuel Poças Maia
Poças, viticultura

Desde muito nova teve contacto com o Douro, e sempre teve a certeza de
que teria uma profissão que a ligasse à natureza. Agricultura ou
veterinária, eram as duas únicas hipóteses de estudos para a jovem
Maria Manuel Maia, pertencente à quarta geração da que é ainda hoje
uma casa produtora de vinho do Porto cem por cento portuguesa e que
mantém a família unida. A opção recaiu na Universidade de
Trás-os-Montes e Alto Douro, curso de engenharia agrária. Apesar de ir
com a família para as quintas de Santa Bárbara, perto da Régua, e Vale
de Cavalos, em Freixo de Numão, só se apercebeu da beleza da
viticultura quando estava na universidade. Ao mesmo tempo, crescia-lhe
dentro «o orgulho de trabalhar no que os meus antepassados me tinham
deixado». Foi contudo só já em funções na empresa, enquanto única e
total responsável pela viticultura, que se apercebeu com plenitude da
herança familiar que lhe estava confiada.
É de opinião que as vinhas durienses precisam de inovação e adaptação
aos perfis dos vinhos que ali se produzem. «Ainda é preciso pensar a
fundo o que estamos de forma geral a fazer no Douro». Fala com
propriedade, já que a Poças foi das casas que mais cedo se voltou para
os vinhos de mesa, a par dos tradicionais vinhos do Porto. Dentro de
seis anos completam um século de existência, «praticamente tudo mudou,
até na propriedade, no tempo da fundação praticamente nenhuma casa de
vinho do Porto detinha diretamente vinhas». Além disso, não havia
vinhos do Douro (mesa). «O controlo familiar é hoje mais intenso,
porque a família cresceu e diversificou-se, gerindo os diferentes
departamentos.»
No centenário, Maria Manuel gostava de fazer «uma grande festa»,
celebrando a família e o êxito alcançado. Sobre um mundo ainda muito
povoado de homens, concorda que é «a única mulher no ativo, mas a
mulher foi o elemento base da empresa». Refere-se às duas filhas do
fundador Manoel Poças Júnior, Maria Teresa Poças e Cacilda Poças.
Celebração do feminino.

A gestão marca a diferença
Madalena Sacadura Botte
Quinta da Bica, gestora

Quando frequentava o curso de comunicação empresarial no Instituto
Superior de Ciências empresariais, em Lisboa, Madalena não imaginava
nem que a sua profissão se desenvolveria no tema do vinho, nem que se
mudaria de armas e bagagens para Santa Comba de Seia. Ainda estagiou
como jornalista, durante cinco anos trabalhou em assessoria de
imprensa e em 2006 estudou gestão de turismo no Rio de Janeiro.
«Depois, foi altura de ajudar a minha mãe na gestão e desenvolvimento
comercial dos nossos vinhos.»
A intenção de se mudarem para a Quinta da Bica até foi sugerida pelo
seu marido, logo após o casamento. Hoje têm duas filhas pequeninas e
todas as semanas conseguem estar juntos na casa que sempre foi espaço
de reunião familiar, férias e fantasia. Enquanto trabalhava num banco,
Madalena ia consolidando a estratégia comercial da casa, ao mesmo
tempo que impulsionava o enoturismo. Acabou por deixar a atividade
bancária para se dedicar exclusivamente às funções comerciais que
vinha desenvolvendo. Atualmente exportam setenta por cento da produção
e o mercado interno requer muita atenção. «Em cinco anos apenas, tudo
mudou no Dão. Lembro-me de começar a trabalhar na quinta e de os
vinhos do Dão não estarem nas preferências dos consumidores.»
Entretanto, o mercado despertou para as mais-valias da elegância e
equilíbrio dos vinhos daquela região. «Agora o mercado está em
expansão, apesar das dificuldades que são de todos conhecidas.» O
enoturismo é a grande aposta, «é aqui em casa que os nossos vinhos se
mostram melhor e é aqui também que as pessoas os podem conhecer
plenamente». Estão prestes a lançar um novo vinho, Vinhas Velhas 2007,
o que se prevê que aconteça ainda em novembro. A produção total é de
sessenta mil garrafas, o que não é muito mas que para Madalena
«representa o cuidado extremo que pomos no vinho que produzimos». E
remata: «É assim que marcamos a nossa diferença.»

http://www.dn.pt/revistas/nm/interior.aspx?content_id=2893729

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