21.11.2011
Helena Geraldes
Cimeiras em países distantes e tratados internacionais são os grandes
temas das notícias climáticas na imprensa portuguesa, conclui um
estudo a três jornais, divulgado esta tarde em Lisboa. Os impactos
locais e regionais estão quase ausentes.
As alterações climáticas "são um assunto demasiado distante das
pessoas, uma questão de grandes acordos internacionais que é decidida
longe e com poucos reflexos a nível nacional", disse ao PÚBLICO a
investigadora do Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade
de Lisboa Luísa Schmidt, uma das autoras do estudo "As Alterações
Climáticas nos Media e na Opinião Pública".
O estudo, que faz parte do projecto internacional COMPON (Comparing
Climate Change Policy Networks) para analisar cobertura mediática das
alterações climáticas e onde também participou Ana Horta, do ICS,
analisou uma amostra de 431 artigos publicados entre 2007 e 2010 nos
jornais "Diário Económico", "Jornal de Notícias" e PÚBLICO.
Os principais temas dos artigos analisados são os "acordos globais" e
as "políticas europeias/nacionais" sobre alterações climáticas. Entre
os menos abordados estão as práticas de sustentabilidade de cidadãos e
empresas. Apenas 2,6% dos artigos dizem respeito à escala local e 3% à
regional. Metade dos artigos fala de políticas, 10% da sociedade
civil.
"A escala regional e local têm referências praticamente ausentes" nos
jornais, disse ao PÚBLICO Anabela Carvalho, do Departamento de
Ciências da Comunicação da Universidade do Minho, que também
participou no estudo. "E isto é problemático porque os cidadãos têm
dificuldade em ligarem-se a estas questões. As alterações climáticas
são construídas fora do alcance da intervenção do cidadão",
acrescentou. Por exemplo, "não há cruzamento entre planos rodoviários
e alterações climáticas".
Outra das conclusões que Luísa Schmidt salienta é o facto de os
jornais não fazerem a ligação entre a crise económica e financeira e a
crise climática e energética. "Vivemos um momento extremamente
complicado, quando a crise económica obscurece tudo." A investigação
registou uma queda quase abrupta do número de notícias em 2009 e 2010,
desde a crise. "O problema é que ninguém liga os dois tipos de crise.
Estão acantonadas. Os jornais abordam o assunto muito ligado só às
questões do ambiente quando este também diz respeito a muitas outras
coisas como a saúde, economia, energia e agricultura".
O PÚBLICO é o jornal que deu mais voz aos cientistas, instituições
europeias, organizações internacionais, administração central/regional
e associações e cidadãos. O "Jornal de Notícias" foi o jornal que mais
espaço deu aos Governos estrangeiros e aos partidos políticos e o
"Diário Económico" aos agentes económicos e autoridades locais.
Anabela Carvalho participou no projecto da Universidade do Minho "A
Política das Alterações Climáticas: Discursos e Representações", de
2005 a 2008", e hoje diz ter ficado surpreendida com a predominância
do Governo e de fontes estatais enquanto fontes para a cobertura
climática. Também notou que a comunidade científica é pouco activa na
disseminação da sua informação e que as organizações não
governamentais de ambiente são muito menos referidas nas notícias do
que as empresas.
"As pessoas estão interessadas [nas alterações climáticas] mas têm um
grande sentimento de impotência. Associam mais a esta questão palavras
como secas, inundações, degelo e incêndios do que energias renováveis
e transportes limpos. Têm uma imagem muito negativa, sentem-se mais
vítimas do que agentes de resolução", comentou Anabela Carvalho.
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