Opinião | 07-09-2011
por Jorge Almeida
O vitivinicultor do Douro não vai facturar, nesta vindima, o
suficiente para realizar um granjeio normal em 2012 e ao mesmo tempo
obter proveitos para a sua sobrevivência.
O Douro tem uma agricultura de montanha, assente numa superfície
territorial de morfologia muito acidentada, com um solo pouco fundo,
pobre de nutrientes, que exige um granjeio muito cuidado, sob pena de
falência da produção e rápida degradação do poder vegetativo das
videiras. Ela é também por isso uma região única.
O recursos
financeiros necessários para instalar uma vinha no Douro, e para
proceder aos trabalhos agrícolas durante o ano, são muito superiores
nesta região do que noutras regiões demarcadas, como Bairrada, Dão,
Alentejo, Bordéus ou Rioja. A produtividade por seu lado é muito menor
na nossa região que em todas as outras regiões congéneres. O Douro tem
um produto (Porto) que é único de facto, mas é ao mesmo tempo uma
região com um dos granjeios mais difíceis e mais caros do mundo.
Ser agricultor no Douro é estar desvinculado duma cultura
dominantemente economicista. Ser agricultor no Douro é acima de tudo
um acto de paixão, de amor, de seguimento de um legado genético e
patrimonial.
No Douro a terra arável foi conquistada palmo a palmo, pá a pá,
picareta a picareta, ferro a ferro contra as agruras da natureza. Deus
deu-nos o sol e um território agreste. Nós fizemos este anfiteatro de
sonhos.
Poderá haver alguém neste mundo mais amante do seu quinhão, da sua
courela, do seu quintal, como as nossas gentes?
Quando visionei as imagens da televisão referentes à manifestação do
passado dia 31 de Agosto, fui assaltado por um sentimento muito
complexo e difícil de definir, mas todo ele dominado pela tristeza e
pelo reconhecimento da falta de orientação, de apoio, de informação,
de resolução dos problemas, a que este povo tem estado sujeito.
Berrar contra o "roubo" das 25000 pipas de benefício é um acto de
desinformação e mesmo de ignorância, mas que significa também a
presença viva de um povo que não se conforma e que quer continuar a
lutar para defender a sua vida e o seu património. E é com este povo
que temos que fazer um Douro melhor.
A crise é conjuntural, mas acima de tudo estrutural. A diminuição das
vendas de Porto, tanto no mercado nacional como no internacional, o
acumular de stocks, ao longo dos últimos 10 anos, nos armazéns dos
exportadores, bem acima da Lei do Terço, o excesso de oferta
relativamente à procura, a inevitável queda dos preços, são variáveis
que estão muito longe de esgotar os graves problemas que a região
atravessa, e que se não forem corrigidos poderão levar a uma nova e
verdadeira filoxera no Douro.
A reforma das instituições, como a Casa do Douro, e o IVDP, é urgente.
A mudança cultural, organizacional e gestionária das Adegas
Cooperativas e das diversas associações, deveria ter sido feita ontem.
Uma visão moderna, actualizada, proactiva sobre a melhor forma de
rentabilizar os diversos produtos da região, que faça aumentar o
rendimento por hectare, é um imperativo a concretizar de imediato.
É em momentos de crise como este que devemos aproveitar todas as
janelas de oportunidade. É em momentos de crise como este que temos
que ser proactivos, "fazer das tripas coração", enfrentar lobbies de
interesses, mudar os processos, acabar com os vícios e com as
mordomias de gente instalada, mudar o que é disfuncional e ajustar
todo o sector às exigências do negócio e à sustentabilidade de
produtores e comerciantes.
Valorizar o Porto, o Moscatel, o Doc Douro e o Mesa, de forma a obter
o máximo rendimento por hectare.
Será isto o que se tem vindo a fazer? Claro que não! Se a política
para a região fosse outra, não ficariam, como vão ficar este ano,
milhares de pipas de vinho, por colher, nas videiras, ao mesmo tempo
que a região está a importar aguardente no valor de mais de 20 milhões
de euros.
"Deus deu-nos as nozes. Será que não vamos ter dentes?"
(continua na próxima edição)
http://www.noticiasdevilareal.com/noticias/index.php?action=getDetalhe&id=11274
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