terça-feira, 18 de agosto de 2015

Sobreiro: Genoma da Árvore Nacional de Portugal entrou na recta final da descodificação

18-08-2015 
 


 
A árvore escolhida vive numa herdade em Montargil. A sequenciação do sobreiro, um projecto português, incluiu a criação de 266 árvores com pedigree conhecido, para perceber a hereditariedade e confirmar resultados. Até ao fim do ano, a equipa quer publicar os primeiros resultados.

A primeira etapa do projecto de sequenciação do genoma do sobreiro (Quercus suber), que arrancou em 2013, está agora na sua fase final. O genoma da árvore está prestes a ser descodificado e a ideia é submeter os resultados para publicação à revista Nature já no final deste ano. A equipa portuguesa liderada por Sónia Gonçalves, investigadora do Centro de Biotecnologia Agrícola e Agro-Alimentar do Alentejo (Cebal), em Beja, e que engloba cientistas de várias instituições, está encaixar as últimas peças de um quebra-cabeças genético nunca antes desvendado.

«O nosso objectivo era identificar os genes que são únicos para o sobreiro, isto é, perceber por que é que há árvores que são melhores do que outras, quais são os genes que provocam essa diferença», explica ao Público José Matos, do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV) envolvido no projecto. «Neste momento, estamos a montar as últimas peças do puzzle do genoma».

O projecto GenoSuber estava já preparado para arrancar há mais de oito anos, mas não começou antes por falta de financiamento. A evolução das metodologias de trabalho veio baixar o custo da sequenciação do genoma e possibilitou o avanço dos estudos. Em Outubro de 2012, assinou-se o plano de trabalho orçado em 1,13 milhões de euros. Deste montante, 85 por cento foi financiado pelo Quadro de Referência de Estratégia Nacional (QREN) e o restante assegurado por entidades privadas, com destaque para a Corticeira Amorim, que também colabora no projecto e garantiu 7,5 por cento do dinheiro.

A entrada no projecto da Corticeira Amorim, a maior produtora mundial de cortiça, veio tornar possível o contacto com a fileira florestal, permitindo à equipa conhecer mais de perto os problemas associados à produção e à transformação da cortiça, orientando também a investigação no sentido de os resolver.

Além do Cebal, a entidade promotora do GenoSuber, e do INIAV, participam ainda no projecto o Instituto de Tecnologia Química e Biológica da Universidade Nova de Lisboa (ITQB), o Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica (IBET), o Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), os três em Oeiras, e o parque Biocant, em Cantanhede. Com 28 investigadores, o projecto da descodificação do sobreiro por uma equipa portuguesa tem ainda como consultores o belga Yves van de Peer, da Universidade de Ghent (Bélgica), e o norte-americano Gerald Tuskan, do Laboratório Nacional de Oak Ridge, nos Estados Unidos.

Escolher a árvore que iria ser sequenciada não foi um processo simples. Os sobreiros cruzam-se frequentemente com outros carvalhos, árvores também do género Quercus, resultando em híbridos do ponto de vista genético, mas que visualmente são sobreiros. Numa fase inicial, a equipa seleccionou 50 sobreiros a nível nacional, para daí encontrar o sobreiro com o mínimo de heterozigotia possível, ou seja, menor variabilidade genética.

O trabalho de selecção envolveu a recolha de material vegetal das 50 árvores, com identificação geográfica e fotográfica, a extracção de ADN das folhas e ainda a caracterização molecular com marcadores de microssatélites já disponíveis para sobreiro, pequenas sequências de ADN repetidas, que são utilizadas como marcador genético em estudos de parentesco. Daqui resultou a identificação da árvore a ser sequenciada: um sobreiro, com idade entre 120 e 150 anos, localizado na Herdade dos Leitões, em Montargil, no concelho de Ponte de Sôr.

Os investigadores começaram por retirar ADN de folhas desta árvore, para ser sequenciado em laboratórios dos Estados Unidos e da China e também em Portugal, no Biocant e no INIAV. Estando este trabalho quase completo, a equipa portuguesa tem agora em mãos milhares de pequenas sequências de ADN, que serão montadas até ao final deste ano. O genoma do sobreiro tem 24 pares de cromossomas, o humano tem 23 pares, com milhares de genes ali contidos.

«Não queremos olhar só para os genes, também queremos olhar para os transcriptomas», explica Sónia Gonçalves. Um transcriptoma é um conjunto de ARN resultante da transcrição de ADN, que irá sintetizar proteínas a partir dos genes. «Isto permitirá perceber as bases genéticas do sobreiro».

O processo de montagem do genoma já sequenciado veio exigir novas competências de bioinformática para tratar um tão grande número de informação. Por esse motivo, a equipa contratou cinco especialistas que para realizar a análise, e que poderão trabalhar em futuros projectos de sequenciação de genomas.

Ao longo da primeira fase, os investigadores depararam-se ainda com a necessidade de ter uma nova população de sobreiros cujos progenitores fossem conhecidos. Esta população, de um viveiro em Pegões, conta já com 266 sobreiros que têm o pedigree bem estabelecido e vai ajudar os trabalhos de organização do genoma em cromossomas.

Fonte: Público

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