segunda-feira, 10 de outubro de 2011

João Miranda “O governo não tem uma estratégia para o sector agro-alimentar”

Por Isabel Tavares, publicado em 10 Out 2011 - 03:00 | Actualizado há
48 minutos 47 segundos
São 4% do PIB, 2 mil milhões de euros. O sector sente-se penalizado
pela má imagem de Portugal no exterior

Esteve em Lisboa a convite do grupo parlamentar do PS para assistir a
uma conferência sobre internacionalização e financiamento de empresas.
Ficou a saber o mesmo. Incomoda-o o facto de os governos não terem uma
orientação para o agro-alimentar, a indústria mais importante para
Portugal e para a Europa.
O presidente da Portugal Foods, João
Miranda, critica a falta de estratégia com conhecimento de causa. Está
à frente de uma empresa familiar, a Frulact, que actua no mercado há
mais de 15 anos e que gera um volume de negócios de 70 milhões de
euros, 95% do qual em exportações. A Portugal Foods tem 80 associados,
entre empresas, institutos e universidades. E as cerca de 30 empresas
representadas na associação são responsáveis por 40% dos 2 mil milhões
que Portugal exporta todos os anos em agro-alimentar, 4% do Produto
Interno Bruto total, sem incluir as fileiras do vinho e do azeite. São
110 mil postos de trabalho directos.
João Miranda não deixa de se espantar com aquilo que o agro-alimentar,
como prefere chamar ao sector, "porque inclui pescado", tem conseguido
nos últimos anos, tendo em conta a má imagem que Portugal tem no
exterior. E fala em vender para o norte de África, um mercado de mais
de 300 milhões de consumidores que está ávido de produtos portugueses,
para quebrar a dependência de Portugal em relação à Europa.
Mas fala de outras formas de as empresas se internacionalizarem. A
criação de plataformas industriais no exterior é uma delas,
contrariando a obsessão do governo pelas exportações. Outra, é ir para
fora à boleia das grandes cadeias de distribuição nacionais, como a
Sonae e a Jerónimo Martins, que estão a dar os primeiros passos na sua
própria internacionalização.
Vem animado do Parlamento?
O chato é que os ciclos políticos criam rupturas que levam esta gente
a começar tudo do princípio: diagnósticos, estudos… E já está tudo
feito, não precisamos de nada disto. É terrível quando mesmo os
empresários já têm todas as relações criadas, os contactos, e têm de
voltar ao início. Não há pachorra para esta coisa.
A mudança é negativa?
A alternância política é positiva, mas tem o lado mau. Novo governo,
novas orientações, novas políticas, novos diagnósticos, novas
estratégias... Que depois não são concluídas. As coisas avançam muito
pouco além da fase do estudo. Mas em algumas situações, sinto que há
neste governo continuidade.
São as estruturas que não funcionam?
Sou muito crítico em relação às estruturas. Fala-se na regionalização,
por exemplo. Em Portugal, temos o modelo das comissões de coordenação
regionais. Mas os presidentes dessas comissões mudam com os governos e
lá estamos nós reféns de quem está no poder. Os novos presidentes
estão alinhados com o governo quando deviam estar alinhados com os
interesses da região.
No meio disso, onde fica o sector agro-alimentar?
O agro-alimentar está em terra de ninguém. Depende do Ministério da
Agricultura e depende do Ministério da Economia… Estas indefinições
têm décadas. Se olharmos para todos os ministérios dos últimos
governos não encontramos um que tenha "alimentação" na sua designação.
Mas Espanha, França, Alemanha, Dinamarca, Húngria, todos têm
ministérios em que incorporam a alimentação.
E isso é importante?
Quando se incorpora um nome é porque se lhe está a dar importância. E
nós, ao longo destes anos, não demos importância à alimentação, que é
fundamental ao nível da saúde pública, da sustentabilidade da
agricultura, da agro-indústria.
A agro-indústria é terra de ninguém?
Agora a agricultura é moda, mas entre os produtos agrícolas, que são a
produção, e aquilo que é a distribuição, há fases na cadeia de valor
que são esquecidas pelo Estado. E esta, no meu entender, é a fase da
cadeia de valor das mais impotantes em qualquer país. A indústria
alimentar é a mais importante indústria da Europa e é a mais
importante indústria em Portugal.
E o governo não lhe reconhece valor?
Não está para aí virado. Não faz parte do discurso, não faz parte da
agenda, não faz parte da estratégia. Estamos numa zona cinzenta. O
Ministério da Economia não olha para a agro-indústria ou indústria da
transformação e a agricultura e pescas só olha para a produção.
Ninguém se interessa pelo resto.
O Estado tem empresas públicas em todos os sectores, mas não na
agro-indústria...
É verdade.
Isso é bom ou mau?
É bom porque significa que as empresas agro-industriais evoluíram
enormemente sem a ajuda do Estado. Tirando os fundos comunitários,
nunca houve orientações. E as empresas conseguiram evoluir e chegar a
níveis de competitividade de estado de arte, e hoje estão ao nível do
que de melhor há no mundo.
Vai ver que essa foi a sorte, a ausência da mão do Estado...
Ninguém pede para ser regulado. O que há é necessidade de dar atenção
a um sector muito importante para o país e que pode responder àquilo
que são os desígnios da nação em termos de internacionalização,
exportações, importância da agricultura. Quanto mais fortes estivermos
na agricultura, mais fortes estaremos na agro-indústria e vice-versa.
Se a indústria de transformação for forte, alavanca o sector primário.
Isto é só enquadramento estratégico, mais nada.
Disse que estão a crescer lá fora...
Pois, mas quando vemos como o agro-alimentar é projectado no exterior
é que ficamos preocupados. As empresas de per si vão sozinhas a todo o
lado e vendem para todo o mundo. Fazemos o nosso percurso, mas somos
penalizados com a imagem de Portugal no exterior.
Que imagem tem Portugal no exterior?
A questão é que apesar de não haver uma estratégia, há apoios
financeiros. Mas não são selectivos, nem têm foco.
A nossa representação no exterior, nas feiras de referência, nos
locais de promoção a nível mundial, foram feitas ao longo dos últimos
anos de forma muito má. As melhores empresas portuguesas sempre se
recusaram a ir para o pavilhão Portugal.
Porquê?
Porque estavam mal representadas e então o melhor é estarem sozinhas.
Mal representadas como?
Hoje, se numa feira internacional olhar-mos para o pavilhão de
representação de Portugal ficamos nós mesmos empobrecidos. Aquilo não
é representativo de Portugal e isso é um drama.
É por isso que, mesmo em Portugal, faz--se apenas uma feira da
alimentação, a Alimentária, que ainda assim tem uma participação cada
vez menor.
Qual é o problema de fundo?
Portugal não tem uma imagem de país produtor. Se o país não se
consegue projectar nas feiras e nos locais de promoção com
modernidade, imagem, inovação e com produtos de valor acrescentado…
Como é que isso se consegue?
Com o que temos estado a fazer. Criámos a Portugal Foods, a marca
Umbrella para o agro-alimentar. Mas daí a credibilizar, validar junto
das entidades essa imagem, é um grande percurso. E é preciso ver que
há imensas associações, proliferam as associações em Portugal. E todas
se candidatam a fundos para a área agro-alimentar.
E isso é contra-producente?
É. Qualquer um que tenha ajuda financeira vai lá fora, mesmo que não
tenha qualidade. Por outro lado, dispersam-se as ajudas, dispersa-se o
esforço, que poderia estar mais concertado.
Em três anos, o que fez a Portugal Foods?
Primeiro, o percurso de ter à volta da mesma organização as empresas
que representam o que de bom se faz em Portugal, para depois sermos
capazes de promover essa imagem no exterior.
Qual é a estrutura da Portugal Foods e como funciona?
É uma estrutura muito leve, com uma gestão empresarial e focada nos
resultados. Temos três pessoas e, em termos de financiamento, somos
subsidiados pelo quadro comunitário de apoio e pelas quotizações pagas
pelos associados.
É auto-sustentável?
Sim. Os custos de funcionamento são baixos e com massa crítica é mais
fácil de sustentar. Depois, temos alguns serviços que p
http://www.ionline.pt/dinheiro/joao-miranda-governo-nao-tem-uma-estrategia-sector-agro-alimentar

1 comentário:

Anónimo disse...

Infelizmente o governo não tem uma estratégia neste sector, nem em nenhum outro e o resultado é o estado a que chegamos,mas a culpa é de todos por sermos coniventes com esta situação.É um problema que se arrasta à décadas.

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