quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Açores: “Podem estar em causa investimentos futuros na Agricultura”



2013.02.28 (00:00) Açores
A Federação Agrícola dos Açores, presidida por Jorge Rita, considera 'razoável' um corte de seis milhões de euros nas verbas do Plano e Orçamento de 2013 para o sector agrícola em relação ao ano anterior, mas "nunca" o previsto corte de 16 milhões de euros inscritos pelo executivo açoriano nos documentos.

A Federação quer que, na apreciação do Plano e Orçamento no Parlamento, a verba da Agricultura seja reforçada em nove a dez milhões de euros e Jorge Rita explica as razões para esta posição numa entrevista ao 'Correio dos Açores'.

Correio dos Açores (CA): Disse, recentemente, que o corte de 25% nas verbas do Plano e Orçamento da Região para o ano em curso, em relação a 2012, é demasiado elevado. Porquê?
Jorge Rita (JR): Sim, é verdade. E o nosso parecer, em relação a esta situação, é bem claro e objectivo. Na entrega da documentação foi-nos transmitido que este corte era de 11%. Anunciaram-nos que, no total, a redução das verbas para a Agricultura seria na ordem dos 15%. Na altura, mostramos alguma satisfação – não pela redução – mas na comparação com os cortes noutros sectores de actividade. Quando começamos a analisar as contas, verificamos que a redução de verbas regionais para investir no sector agrícola vai para além do que nos foi comunicado. Concluímos que a redução é de 25%.

CA: E o que representam estes 25%?
JR: Representam 16 milhões de euros. E este valor, num plano anual para a Agricultura, na Região, onde existem muitos compromissos assumidos que estão por resolver; existem muitas infra-estruturas em construção que é preciso concluir; e, para os investimentos com apoio comunitário, a dotação regional terá sempre de estar disponível.

CA: Receia que, com menos 16 milhões de euros no plano regional, não haja a componente financeira regional para comparticipar todos os projectos financiados pela União Europeia…
JR: E não é só esta situação. Há compromissos assumidos pelo Governo dos Açores e, como costumámos dizer, 'é preciso limpar a casa'. Portanto, há muitas verbas assumidas pelo governo regional, em matéria de Agricultura, que têm de chegar ao destino. E existe até o compromisso que isso vai acontecer até ao final de Março, altura em que o plano entra em vigor. E, além disso, há investimentos que têm de continuar a ser feitos na Agricultura, sobretudo em infra-estruturas, caminhos, água e luz nas explorações. Tem de se ter, sempre, na Região, uma atenção muito especial para estes investimentos.
É por isso que entendemos que uma redução de 16 milhões de euros na Agricultura é exagerada. No nosso parecer ao plano, que vai ser apreciado no âmbito da Assembleia Legislativa regional, apontamos que em vez dos 16 milhões, houvesse uma redução de seis milhões. Na rectificação que devem fazer, terão de aumentar o investimento no sector agrícola entre os nove e os dez milhões de euros. Esta seria uma situação que nos satisfazia.
Mantendo-se a redução de 16 milhões de euros no plano, podemos ter problemas de sanidade, na manutenção dos caminhos florestais, poderá haver uma redução de investimentos no IROA e as implicações que tem na manutenção dos caminhos agrícolas. Estas situação têm de ser ponderadas e, sendo este um sector vital para a economia regional – como se tem provado ao longo dos anos -, não podemos aceitar que haja uma redução substancial de 25% no volume de verbas no Plano e Orçamento em relação ao ano anterior.

CA: Não receia que a atitude da Federação Agrícola dos Açores de crítica a uma redução de 25% nas verbas do Plano de 2013 para o sector agrícola não seja bem entendida pela sociedade no momento de crise que a Região atravessa?
JR: Vamos lá a ver. O Governo dos Açores tem adoptado uma postura que considero correcta ao assumir que, por a Região estar a cumprir os objectivos, não deve ser penalizada nas transferências do Orçamento Geral de Estado nem na redução do diferencial dos impostos. Eu tenho aplaudido esta postura. A verdade é que está demonstrada que a Região foi, a nível nacional, a que melhor cumpriu as regras e fez melhor aproveitamento dos fundos comunitários. Por isso, tem uma situação económica mais saudável.
Agora, este princípio aplica-se precisamente à Agricultura. Se o sector agrícola cumpriu, se mantem uma situação económica mais favorável que outros sectores de actividade – por uma melhor utilização das verbas que foram sendo disponibilizadas - , não poderá ser, agora, penalizado tanto como outros sectores, muito menos em favor deles.
Respeito e tenho muita consideração e estima por todos os outros sectores de actividade da Região, como a saúde, a educação e o turismo. Estes são, também, sectores importantes no nosso dia-a-dia. Mas, sendo a Agricultura vital para a economia açoriana, uma redução drástica nas verbas para este sector leva a que a própria economia corra riscos.
Quando temos um sector que é importante, que tem crescimentos anuais de produção, que aumenta todos os anos o nível das exportações, contribuindo para que a balança comercial seja mais favorável. Se todos consideram o sector agrícola importante e afirmam que é fundamental exportarmos cada vez mais, O que se deve fazer é canalizar o máximo de esforço financeiro da Região para este que é o maior e melhor sector de actividade da economia regional.
O que se tem verificado é que todo o investimento no sector agrícola tem sempre retorno, de forma transversal, em toda a economia açoriana como tem sido provado ao longo dos anos.

CA: O que está a dizer é que a Agricultura é uma mais-valia na economia açoriana que não deve ser desprotegida e é o pilar fundamental da economia que não deve ser enfraquecido…
JR: Não pode, não deve ser enfraquecido. Tem é de ser fortalecido. Até porque se a Região quiser sair, nos próximos anos, da crise que está instalada, sairá, de certeza absoluta, se reforçar o sector agrícola. A Agricultura é o sector da nossa economia que mais rapidamente fará com que o país e a região saiam da situação económica e social grave em que estão as empresas e as famílias.

CA: A Agricultura está disponível para um corte, mas não de forma a prejudicar o sector…
JR: Sabemos que existem cortes. Aceitámos que haja alguns cortes, sugerimos até onde pode haver alguns cortes no sector agrícola. Temos consciência que tem mesmo de haver cortes mas nunca um corte de 25% nas verbas para a Agricultura.
Consideramos que um corte de 9 a 10% é razoável no quadro actual em que vivemos. Podemos abdicar de um caminho, de um ou outro investimento, mas há condições que são obrigatórias, sobretudo ao nível de compromissos assumidos, da componente regional para financiamentos comunitários e de investimentos em infra-estruturas agrícolas. Não podemos aceitar que haja um corte de 25% porque, uma mais do que outra, estas condições obrigatórias ficam em causa.
Aliás, esta redução de 25% prevista no plano regional afectará a nossa economia agrícola e, de uma forma transversal, todos os outros sectores de actividade.

CA: Um corte de 25% nos investimentos na Agricultura, põe em causa a economia açoriana?
JR: Pode pôr em causa alguns investimentos para o futuro da própria agricultura e a própria economia açoriana.

CA: Qual é a posição da Associação Agrícola de São Miguel sobre a perspectiva do preço do leite baixar, agora, com a sazonalidade?
JR: Hoje existem cada vez menos argumentos por parte da indústria nas questões da sazonalidade. E tanto existe menos argumentos que, muitas vezes, tem havido várias alterações na aplicação directa da sazonalidade. Houve um período em que a indústria justificava, constantemente, que a sazonalidade resultava de questões de mercado. Mas, neste momento, não há quaisquer problemas de escoamento dos produtos lácteos açorianos. E, por incrível que seja, se alguém quiser dizer o contrário, está a mentir.
Em termos de mercado, presentemente, as indústrias de lacticínios de São Miguel têm tudo vendido ou quase. Há uma guerra interna entre as indústrias por procura de leite com efeitos positivos, durante o mês de Janeiro, na produção, com alguns aumentos de preço praticados por algumas indústrias. Ora, se eles aumentaram o preço do leite em Janeiro – por falta de leite – o mês de Fevereiro, Março e Abril vão na mesma linha. Até porque as condições climáticas não foram muito boas, os custos de produção estão muito em alta e, face a estas circunstâncias, não é fácil aumentar muito a nossa produção leiteira.
E a indústria, ao necessitar de mais leite, não é baixando o preço do leite na produção que poderá ter este efeito. Aliás, se houver alguma indústria que baixe o preço do leite nos próximos tempos, saberá que da parte da Associação Agrícola de São Miguel, tudo faremos para que a indústria que assim proceda tenha menos leite no futuro. Iremos mesmo criar grandes dificuldades à indústria que não tiver bom senso e algum equilíbrio na situação da sozanalidade que ocorre nesta altura.
Temos de reconhecer que as indústrias, algumas vezes, - hoje mais do que ontem – têm tido comportamentos muito positivos que nós realçamos. Neste momento, a nossa indústria está bem apetrechada e modernizada. Houve muitos apoios do Governo dos Açores nestas indústrias e hoje também se reconhece que elas começam a apresentar alguns produtos com valor acrescentado, procurando novos mercados no exterior.
A verdade é que a indústria tem feito muito melhor o seu trabalho de casa, com leites e queijos premiados em diversos certames a nível nacional. Ou seja, neste momento, ninguém na produção está à espera de uma baixa do preço de leite na sazonalidade.
Pelas contas que todos nós temos, não pode haver uma baixa do preço do leite e até deve haver subidas do preço do leite à produção nos próximos tempos, face a custos de produção em alta. Basta olhar os preços recorde do gasóleo agrícola, as subidas dos preços dos cereais, o aumento das taxas de juro e as dificuldades de crédito e até as condições climáticas não nos ajudam. A indústria tem conhecimento desta nossa realidade porque tem os mesmos dados que nós. E, em contrapartida, este mesma indústria está numa posição favorável em termos de escoamento dos seus produtos e alguns até com algum valor acrescentado. Obviamente que, face a estas circunstâncias, há que repartir dificuldades e tem de haver consciência e bom senso.

CA: Sabendo que a Unileite tem vindo a assumir um papel preponderante na definição dos preços do leite à produção durante os últimos anos, toda a lavoura está esperançada que mantenha a sua postura de vanguarda e passe por cima da sazonalidade sem mexer nos preços do leite à produção. Acredita que a Unileite não vai baixar o preço do litro de leite no período de sazonalidade?
JR: Estou convencido de que a Unileite não baixará, nos próximos tempos, o preço do leite em resultado da sazonalidade. A Unileite também tem todos os seus produtos vendidos. Tem produtos que estão a ser valorizados no mercado. Portanto, é uma indústria que tem crescido de forma sustentada e bem organizada. Tem uma orientação de mercado mais ou menos estável. Aplaudimos esta realidade porque é isso que todos nós desejamos.
E a Unileite tem a noção de que, neste momento, se houver uma baixa no preço do leite, a descapitalização é total na produção. A indústria precisa de leite, nós precisamos da indústria para transformar o nosso leite mas, obviamente, que tem de ser a custo em que todos nós possamos produzir e possamos ter algum rendimento.
Sabendo que nem todo o preço do leite que as indústrias pagam tem, em toda a linha, a ver com eles, mas sim com uma distribuição que tem sido o elemento da fileira do leite que fica com a fatia de leão. A jusante, só têm de vender ao consumidor e os produtos lácteos, muitas vezes, servem como chamariz para boas campanhas de marketing.
A grande distribuição tem que ter aqui uma atenção especial para um sector de actividade que é vital na Região.

FONTE: Correio dos Açores

http://www.anilact.pt/informacao-74/7165-podem-estar-em-causa-investimentos-futuros-na-agricultura

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